Ao sair, apage a luz, por gentileza
Tentou contar essas coisas que não fazem muito sentido quando contadas, e quando escreveu, se revelando como uma perfeita idiota, pareceu que havia ensaiado aquele texto dramático, construíndo as palavras que a tornavam uma mulher acabada, virada em nada, resignada, mas louca às vezes, procurando não sabia o quê, nem aonde. Ou deixando de procurar.
Foi incômoda e infantil. Nenhum mistério naquela fêmea. Mas ela não era prática assim, não ensaiava nem treinava nada, absolutamente! Pois na manhã seguinte já sentia-se tranqüila de novo, naquele seu mundinho, e arrependia-se de ter sido assim, tão melodramática. Ela era assim mesmo, uma complexidade que até enchia o saco e afastava os amigos. Agora, restavam os virtuais.
A cada amanhecer era possível trocar frases de amor, adormecido e honesto, mas a cada noite voltava a ser fugaz e arredia, e escapava-me por entre os dedos. Um peso duplo na alma e na mala, quase insuportável, me arranhava as entranhas. Seria possível viver algo melhor do que isso? Eu já não lembrava. Ela fez o quê de mim, afinal? Os meus restos já eram envelhecidos. O peso de insistir em continuar a carregá-la e perder novos momentos, em troca de quase nada, e o peso do medo da saudade, que já se parecia com um abismo negro e colossal, abaixo dos meus sapatos, estava arqueando demais as minhas costas.