Meus delírios, divagações, realidades e esquizofrenias, a quem interessar possa. Se viestes até aqui por bem, ego venia divinus indulge. Se por mal viestes, qui unum manus imprecatio divinus indulge. Danger: "Reperio scrobis et doli". Os comentários relativos aos posts deste diário são de responsabilidade dos visitantes, bem como condutas impróprias de clonagem de identidade em outros sites. Dúvidas, reclamações, declarações de amor? Email-me.

18 dezembro 2007

Sem título

Esse reloginho estúpido continua a me enganar. Nunca, em hipótese alguma, me conta quanto tempo falta para recomeçar. Esqueci as tardes de chuva sozinha, em casa, separando tecidinhos por cores, por padrões, todos meigos, que me tornaram doce. Descobri hoje! Foram os tecidinhos que me deixaram assim, meiga, quietinha, zumbizinha. Ele esqueceu também. Daquelas tardes. Nessa época, tão aqui atrás quase encostando no meu traseiro, ignorei o tempo mas não naveguei, ficamos ali boiando com coletes salva-vidas. Tinha uns espinhos que ficavam fincados no nosso dorso, mais ainda no meu, e por ali uma seiva gosmenta e ordinária começava a passar e entrar pelos meus poros, e os olhos doces e grandes começaram a ficar mais verdes, mais inconstantes, mais desejosos. Nessa época, eram só os olhos. Agora eles vazam e contaminam o resto, e nesse deserto que agora me encontro, não tem água que leve essa sujeira embora das minhas pernas. Hoje choveu e compreendi tudo, menos como fazer para te fortalecer. Compreendi que vou ter pesadelos a noite quando estiver tudo bem escuro e solitário, e aceito com resignação e coragem, porque os tecidinhos são pipas distantes do meu olhar. Minha transpiração ofegante não é parte dessa chuva, não passa de tédio e tesão recolhido. Ninguém para velar meu sono é tudo o que eu mereço, e meu umbigo promete de se encarregar a virar ao contrário e fazer uma cabana bem segura nos momentos necessários. Nunca estar longe é bom agora mas perto demais é dor sem sentido, egoísmo meu de me querer só prá mim, egoísmo teu de me cortar ao meio, maldade comigo. Meu cigarro e meu chiclete agora nunca acabam, apesar do vinho ter gosto de vinagre, depois de aberto assim na geladeira, sem ninguém botar a boca na garrafa. Essas coisas que deixei envelhecer na geladeira me deixam mais forte e bonita, porque a geladeira não importa nem um pouco na minha pobreza futura, essa que anseio sem medo completamente inconseqüente. Honesta simplesmente. Há dias não queres comer, e eu vou ficando cada vez mais magra e preocupada, mas o amor é o mesmo, o que não cresce é outra coisa, aquilo que não sai do lugar há tempos. Tem um outro gosto experimentado que engoli sem querer esses tempos, um vício esquisito, mas que eu já conhecia. Tu mesmo tinha me mostrado uma vez. Agora a gente canta que é bom nem experimentar. Me sobram muitas coisas, mas sobras não são boas, nem refinadas, nem apaixonantes, tampouco excitantes. Minha amoral e desapego se confunde sem critério algum com a dificuldade de admitir minha própria crueldade, um pouco insana, infantil, tão verdadeira. Ando negando as coisas que me eram tão gratas e escrevendo palavras de insensatez que te ofende os ouvidos, e mesmo assim não dá sede nem fome de comida, e admito que sou mesmo uma maldição. Não quero queimar as mentiras nesse baldinho, elas me são todas verdades necessárias agora, porque sofro sorrindo, esperando que dessa merda toda algo muito belo e leve e requintado nos aguarde em algum momento logo ali na esquina. Esqueci aquelas flores que nunca tinha me enviado num vaso lá em cima, e a água ficou amarela e nojenta, que nem esse negócio que me escorre e tu não sente, não percebe, nem acha feio. Essas teorias que elaboro só te fazem mal e continuo presa nessa sublimação de amor perfeito que ninguém mais acredita, e que terão esquecido logo ali do outro lado da avenida, como quando a gente pisa no toco do cigarro no chão, desdenhosamente. Tu andas mentindo prá ti mesmo que me conhece e que eu te faço bem. E eu aqui, duvidando dos novos gostos, dos sinais que me enviam, das palavras que leio e dos olhares de incredulidade que me lançam como flechas que me machucam e me julgam um pouco sim. Mesmo assim, esses arremessos me enchem de uma coisa que desconheço nos últimos tempos, mesmo sem prova nenhuma, sem consistência nenhuma, de que isso me fará melhor. Não tenho provas, nem suspiros, conheço só agora umas poucas cicatrizes. Elas me ensinaram algumas coisas e fiquei como fascinada por querer me doer e me consertar de novo. Mas se eu me cortar de vez mesmo, e o gosto passar, e ninguém para fazer um curativo forte estiver por ali, será que vai doer sangrar assim? Desculpe, não devia perguntar, porque te deixa pior, ou melhor, querendo provar que minha fragilidade pode ser o motivo de ficares aqui do meu lado. Mas não sou mais pequena, e ando com essa ferramenta na mão que machuca teus olhos e teu peito, arranha tua alma, boceja na tua cara. Tudo assim, rindo, sem pensar, boba, flutuante. Não fica assim que eu não falo. Nunca falei por mal. Quando te comi, engoli um pedaço bem grande, e nunca digeri. Ficou aqui parado, formou um pedaço a mais dentro de mim, no lado direito, não incomoda nada, fica aqui paradinho e tem uma temperatura agradável, nem frio, nem quente demais. Eu não vou arrancar mais, mas andei orçando um botãozinho de on e off, para quando eu quiser sentir um frio enorme ou um calor que me faça transpirar suspirando, sem alterar os fatos da coisa. Por tudo isso, não sei o que te responder. Não será pior? Será que não vai doer?