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14 dezembro 2005

Política 2

Vitória popular nos Estados Unidos:
Reaberto o caso de Mumia Abu Jamal

Negro, muçulmano, ex-militante dos Panteras Negras, escritor e jornalista de oposição, Jamal tem tudo para ser linchado nas terras do Império
Texto de C. Tavares (Brasil)

A corte de apelações do terceiro distrito, Filadélfia, Estados Unidos, aceitou reconsiderar o caso contra o jornalista Mumia Abu Jamal, militante do Partido Panteras Negras, grupo de defesa dos direitos civis dos negros, que foi encarcerado há 23 anos e condenado a morte acusado do assassinato de um policial. Jamal sempre negou o homicídio e há anos o seu julgamento despertou clamor internacional. A partir de 17 de janeiro a corte ouvirá os argumentos da defesa que tenta provar que a sentença foi resultado de discriminação racial e procedimentos irregulares. Os advogados sustentam que a promotoria pública retirou ilegalmente os negros do grupo de jurados que decidiu pela culpabilidade do réu. Sustentam também que o policial Daniel Faulkner morreu por disparo de arma de fogo distinta da que o acusado portava, e que o acusado não foi submetido a exame para verificar se havia resíduos de pólvora em suas mãos, roupas e na arma apreendida. Também há evidências de que o juiz que presidiu o julgamento, Albert Sabo, era racista. Jamal recebeu o apoio de líderes mundiais, como do bispo sul africano Desmond Tutu e do ex-presidente Nelson Mandela, da escritora Alice Walker e até do ator Paul Newman. Até mesmo o presidente francês Jacques Chirac chegou a pedir pela vida de Jamal, ao autorizar o embaixador da França nos Estados Unidos a dar "a título estritamente humanitário e dentro do respeito do direito norte-americano, os passos necessários para salvar a vida de Mumia Abu-Jamal".

Julgamento suspeito
O jornalista Mumia Abu-Jamal está preso há 23 anos. Seu julgamento, conforme acusam várias organizações, entre elas o Comitê Canadense para a Proteção dos Jornalistas, Equal Justice EUA e o Comitê Internacional dos Familiares e Amigos de Mumia Abu-Jamal, realizou-se com inúmeras irregularidades. O juiz que sentenciou Mumia, Albert Sabo, já havia condenado - até 1995 - a pena máxima um total de 31 pessoas, das quais 29 negras, latinas e asiáticas. Nenhum outro juiz nos Estados Unidos possuía tantas execuções em seu currículo.

Mumia Abu-Jamal é jornalista há anos dedicado à luta pelos direitos civis. Na prisão escreveu o livro Live from Death Row (Ao vivo do corredor da morte), cujo texto, traduzido para várias línguas e em vários países, se transformou num libelo anti-racista. Em texto de 1995, Jamal reafirmou sua combatividade: "Continuo escrevendo. Continuo lutando. Continuo combatendo o sistema com a verdade. Continuo me rebelando contra o sistema que quis me matar há 13 anos e que ainda quer fazê-lo hoje." Quando estudante secundarista, Jamal foi assessor de imprensa do Partido Panteras Negras. Trabalhou em rádio, dirigiu seu próprio programa na WUHY-FM, na Filadélfia, e aos 26 anos foi eleito presidente da Associação dos Jornalistas Negros da Filadélfia. É militante do Move, uma organização de negros radicais utópicos da Filadélfia que rechaça os valores da sociedade capitalista, desafia abertamente o poder oficial e promulga que o sistema é totalmente corrupto e destrói a vida no planeta. O Move vem sendo perseguido pela polícia norte-americana de forma selvagem desde 1977.

Na noite de 9 de setembro de 1981, Abu-Jamal dirigia um carro quando viu um negro sendo brutalmente espancado por policiais. Ele tentou impedir o espancamento. Na confusão, Abu-Jamal foi ferido à bala no estômago e um oficial de polícia morreu, sem que nunca tenha sido recuperado o revólver do qual partiu o tiro. Depois de sair do hospital, Jamal foi acusado pela morte do policial. Após um processo cheio de irregularidades, ele foi condenado à morte em 3 de julho de 1982. Na sessão do júri, visando influenciar na condenação e violando as formalidades legais de um julgamento justo, a promotoria utilizou o argumento de que Jamal fora membro, dez anos antes, do Partido Panteras Negras. Em casos semelhantes a Suprema Corte já havia revertido uma sentença de morte, quando um membro da organização racista branca "The Aryan Brotherhood" foi condenado a morte por crime, sendo que, no julgamento, essa filiação fora utilizada como argumento da acusação. No entanto, em outubro de 1990, a Suprema Corte negou a apelação em favor de Jamal.

Como preparar um linchamento legal
As principais irregularidades do julgamento de Abu-Jamal:

1 Um total de onze potenciais jurados negros foram excluídos do processo, assim como um cidadão branco que havia admitido sua indefinição sobre a imposição ou não da pena de morte para o jornalista. Em contrapartida, foi negada à defesa o direito de mudar um jurado que, com antecipação, assegurou estar convencido de que o acusado era culpado;

2 Abu-Jamal teve negado o direito de escolher seu advogado. O juiz, contra a vontade do acusado, designou um advogado que atuou na maior parte do tempo apesar dos protestos do acusado;

3 Não foi permitida à defesa convocar testemunha que declarou ter visto uma outra pessoa saindo da cena do crime;

4 Nas instruções ao júri, durante a audiência que decidiu pela pena de morte, o juiz Sabo não levou em consideração que Abu-Jamal não possuía nenhum registro criminal anterior;

5 O Código de Comportamento Judiciário da Pensilvânia diz que "O juiz deve se considerar impedido nos processos em que se possa duvidar razoavelmente de sua imparcialidade." O processo acusava um negro pelo assassinato de um policial. O juiz Sabo, antes de ser juiz, foi xerife por 16 anos e era membro há muitos anos de várias organizações de policiais, como a Ordem Fraternal da Polícia, a Associação Nacional de Xerifes e a Associação de Chefes de Polícia do Sudeste da Pensilvânia. Por sua origem profissional, Sabo poderia ter atuado com corporativismo e não imparcialidade.

Carta do advogado Robert R. Bryan, de 6 de dezembro passado, que anuncia a reabertura do caso de Mumia:
Estimados Amigos e Apoiadores:
Hoje a Corte de Apelações do Terceiro Distrito dos Estados Unidos emitiu a decisão mais importante que afeta meu cliente, Mumia Abu-Jamal, desde a decisão da corte federal de Dezembro de 2001. Nesta manhã se emitiu uma ordem para que a corte aceite a revisão dos seguintes pontos, os quais são de enorme importância constitucional e que afetam mesmo a essência do direito de Mumia a um julgamento justo e realizado sob o devido processo legal, com proteção eqüitativa da lei sob as Quinta, Sexta e Décima Quarta Emendas da Constituição dos Estados Unidos:
Ponto 14: Se ao apelante foi negado seus direitos constitucionais devido ao processo sumário da promotoria;
Ponto 16: Se o Estado Livre Associado utilizou a autoridade para violar, no julgamento, direitos constitucionais do apelante [Batson versus Kentucky, 476 U.S. 79 (1986)];
Ponto 29: Se ao apelante foram negadas durante o desenvolvimento do processo atuações da defesa pública que resultassem na predisposição judicialalegada;
O Ponto 16 refere-se ao uso pelo promotor de racismo na seleção do júri. O registro estabelece mais além da questão sobre se esse racismo é fato que pesou no caso desde a prisão de Mumia em 1981, e que continua até hoje. O Ponto 14 tem relação com a fase de culpabilidade. Inclui o argumento do promotor de que se Mumia fosse condenado faria "apelação atrás de apelação". Comentário que efetivamente diminuiu a responsabilidade dos jurados, e voltou contra o réu o conceito de presunção e dúvida razoável de inocência contra ele. O Ponto 29 trata da predisposição e o racismo incrível do Juiz Albert Sabo, o juiz que presidiu o julgamento. Desafortunadamente, ele deveria limitar a sua condução até a audiência de testemunhas 1995 (PCRA), em vez de seu comportamento monstruoso no julgamento. Esta restrição se verifica porque os advogados anteriores erroneamente não denunciaram a imoralidade de Sabo no julgamento, um desafortunado equívoco e erro. A corte emitiu também um calendário informativo. O caso está agora em trâmite sumário. A audiência de informação está prevista para 17 de janeiro de 2006.
Por favor envie e difunda este e-mail.
Hoje conseguimos uma grande vitória na campanha para conseguir um novo julgamento e a liberdade final de Mumia. Seu apoio, e compromisso, são muito necessários e apreciados.
Com meus melhores desejos,
Robert R. Bryan
Law Offices of Robert R. Bryan
2088 Union Street, Suite 4
San Francisco , California 94123
Advogado principal de Mumia Abu-Jamal


PS: A ordem também garante as demandas da acusação para ouvir o ponto 25, que era o ponto que Juiz Yohn utilizou para suspender a execução de Mumia. Obviamente a acusação busca a confirmação da condenação.
É preciso que as pessoas conheçam o caso de Mumia, agora em que o reexame do processo está em tramite sumário. Acredito que nós ganharemos e o veremos livre, no entanto a vida de Múmia ainda está em grave perigo.